Colunista - Dr. Sílvio Lopes de Almeida Neto

A JUSTIÇA DO QUARTO PODER

Por Dr. Silvio Lopes de Almeida Neto

24/04/2017

Ao que parece ou deveria ser, vai longe o tempo dos “Roladores Sagrados” de Dayton. A morte de um ser amado é momento de recolhimento, de reflexão e de descobrimento das falhas dele e de nossas muitas falhas. Com tristeza vejo a cara de muitos, ora nos jornais, ora na televisão, ao escopo de buscar justiça. Ao seu modo, Darrow, uma brilhante inteligência, já dizia saber da existência de milhões de pessoas no mundo buscando consolo, nas suas horas de dificuldades, e tranquilidade, em ocasiões de tristeza, na Bíblia. E tanto quanto ele sei que sou o último homem do mundo a tecer qualquer comentário ou, ainda que o pudesse, a fazer qualquer coisa para impedir isso. Em vista de outros motivos, vale acrescentar, também, que a sociedade, a sociedade de hoje, antes de se levantar contra a barbárie e o desmando, deve meditar, ponderar e resolver que antes de execrar alguém que se senta no banco dos réus, entender, que na medida em que julgo e condeno, serei julgado e condenado. Passo adiante disso, o que se pode inferir é que não se deve fazer juízo de certeza, tremer e ao mesmo tempo amar tanto, noticiários acrobáticos e saturados em si mesmos, de tanta mesquinharia.

Se no século XIX já se levantavam as mentes brilhantes e de forma ferrenha, em desfavor da pena capital, a intolerância e um fundamentalismo nocivo, a pergunta que não pode ser calada é sobre qual a razão de tanto castigo? Parece que o certo nessa bagunça toda, televisiva e sensacionalista, vem da falsa ilusão da presença do Estado e seu agente que pretensamente é o fazedor do justo. E agrada principalmente aos escandalosos de plantão. Se por um lado pudéssemos abraçar a filosofia mecanicista, que a meu modesto sentir livra o homem do tirano livre arbítrio, compreenderíamos melhor, que máquinas apresentam defeitos e que não são culpadas por eles. Existe tratamento. Sim, existe tratamento para o homem e seu crime. Negando isso, vem o Estado e seu quarto poder resgatando a ideia de tal afirmação é mera ilusão dos que advogam a defesa de um semelhante. Nada há para ser resgatado em quem comete um crime, principalmente um homicídio. A justiça, aos olhos daqueles, só encontra um norte, a condenação na pena máxima. Melhor caminho, então, é lançar o réu ao precipício, sem maiores delongas, já que todo outro curso, mostrando a existência de dúvidas até quanto a autoria,  em uma desvalia sem tamanho, denominada processo, pouco importa.

E pouco importa, até que um de nossos entes queridos esteja, por qualquer motivação (defeito), sentado naquele banco, esperando ao menos por um julgamento justo, com uma apenação na medida certa, quando for o caso de uma condenação. Já não faço conta do número de “vítimas” por detrás do número de pessoas que defendi. O certo, é que quase nunca, ou raras às vezes, busquei absolvição, ao contrário, sempre busquei o espírito da pretensa justiça dos homens, a pena na medida certa. Vejo-me em desgraça, melhor, vejo a desgraça de muitos homens que tanto quanto outros só acreditava que acontecia com alguém, talvez até próximo, nunca com eles mesmos. Defendo o “criminoso”, nunca o crime. E não inocentemos as “vítimas”, não raras as vezes elas plasmam o “criminoso”.

Esse doente, carecendo de tratamento, aos olhos de leis imediatistas e feitas sob encomenda ou por atacado, só uma esperança pode levar, a multiplicação da agonia de um calabouço. Que reeduca? O texto em questão viesse das mãos de um anarquista de destaque, mereceria análise, o que não é o caso e por isso mesmo vai morrer pela pena capital de seus próprios erros ou coisa que o valha. Certo, entretanto, que seu nascimento veio no dia em que o “BRAZIL” foi descoberto pela FIFA com sendo País do futebol e um “PARAÍSO DA JUSTIÇA SOCIAL”, tudo referendado pela personificação do Estado, que noutro sul permite a morte de suas crianças em um ambulatório que não tem pediatra. Droga e drogas! Não existe avanço nenhum nessa geografia doente. Tudo não passa de um embuste, e sou acusado de advogar para “criminosos”.

O homicídio por certo, sob qualquer pretensa excludente, é algo de pavoroso e o homicida é inexoravelmente visto assim. E isso é impeditivo de um julgamento isento e sob a luz da prova? Ou será que certo é julgar sob influência do poviléu que toma partido sem que saiba do conteúdo? O certo é postular o máximo para se obter o mínimo? Essa é a premissa maior da “justiça seja feita”? Ao final das contas, quero crer que um pedaço de argila, que também é filho ou pai ou irmão ou abandonado ao destino de uma máquina defeituosa, caiu em desgraça e mesmo sem saber, leva consigo o direito de ser julgado “direito”. Lembremo-nos que nosso direito só será protegido se protegemos o direito do outro. O quarto poder sempre vem aos olhos dos desavisados pelo estardalhaço, como aquele único ente na terra que detém a verdade quanto a tudo. Isso, a meu viso sem valor, é autoritarismo puro, escondido nas sombras de uma cerimônia pública e trágica por si mesma. Nenhuma serventia tem a ciência, os estudos dos alienistas, as provas periciais, a menos que socorram os urros da condenação.

Nenhuma valia real tem a atenuante que só existe para que se tenha esse nome no dicionário. Em verdade, posso dizer do fundo de minhas entranhas, que os últimos julgamentos trouxeram à baila um ataque bem sucedido que muito em breve destruirá a sensação de liberdade e de justiça na medida certa. Se o quarto poder, ao amparo de seu pai, o Estado, trilhar por aquele caminho ilusório de sempre pedir mais para obter o menos, estaremos presenciando a abertura das portas para um reinado de injustiça, qual tal a tudo que havia na Idade Média. Se persistirem na trilha, não estará em segurança a liberdade de homem algum, terá desaparecido o ideal de julgamento isento e pena na medida correta. Vencedora aquela ideia, vencedor o Código Penal, que não é livro de justiça, ao contrário, é livro de expiação absoluta.

                                                       

Dr. Sílvio Lopes de Almeida Neto é um renomado advogado com vinte e cinco anos de atuação na área criminal. Ele adora defender seu semelhante e, além dessa bonita profissão, gosta de escrever crônicas nos momentos de lazer. Ele é casado com a rioesperense Drª Sara Miranda, reside na maravilhosa cidade de Rio Espera e é colunista em nosso portal de notícias.