Colunista - Dr. Sílvio Lopes de Almeida Neto

MATOSO

Por Dr. Sílvio Lopes de Almeida Neto

18/10/2017

Pela manhã, ainda meio desembaraçado, desimpedido, desocupado, com certo dei no vinte, advinhando, dei com a chave do enigma. Certo é que vivo em uma localidade afastada e sem habitantes, erma de tudo, mambembe mesmo. A primeira pancada do dia veio do encontro com um sujeito vieux-chêne, cara mesmo de carvalho antigo. Pensei naquele instante em um pileque onça, uma ligeira embriaguez. A propósito o Matoso é que veio aos meus ouvidos ruminar, tornar a mastigar, remoer sobre justiça. Dizia ele que o Pretor Santoro, tipo que lembrava um antigo magistrado romano, usou de pretexto fora da lei para absolver um desafeto seu. Quaresma, o desafeto, lançou-lhe cara adentro um sopapo, pancada dada com a mão fechada na zona abaixo do queixo, um murro, um soco; vou amenizar, um bofetão.

Todas as formas usei para tentar lhe explicar que a decisão do Pretor Santoro não era terminativa, havendo certeiramente possibilidade de recurso para instância superior. Não desista, lhe expliquei. Matoso, contudo, me adjetivou, me qualificou como pedante, ou seja, que eu estava dando ares de sábio. Imaginem minha reação! Com toda parcimônia, economia, sobriedade possível, procurei encetar, então outro assunto. Desviei para o lado da poesia. Matoso me obrigou a estancar a frase ainda pela metade. A jurisprudência da prudência, virtude que nos faz conseguir o que desejamos, evitando todos os perigos, cautela, ainda que eu não a tenha no mais das vezes, veio em meu socorro. Me fiz todo silêncio. Matoso, sequioso, sedento,ávido de águas turvas da discórdia, rumou, então, para a política. Bradou, rugiu aos quatro ventos que a culpa do Pretor estava atrelada, dominada pelo político Figueiredo, contraparente, parente por afinidade, afastado, do Quaresma.

Comentou, outrossim, que o Figueiredo, homem de sobrolho denso e oleoso, era “muito forte na política” e assim o mariola do Pretor se borrou de medo. Don Juan estivesse vivo, testemunha seria de que me afastei tal qual um Huguenote, contudo, sem nenhuma palavra. Passadas algumas horas, sub tegmine, sob a sombra, ponderei, apreciei com madureza, estudei detidamente a revolta do Matoso e concluí que somos mundongos diante dos poderes. Esse golpe tão profundo nos mostra que a Corte Superior se encontra amalgamada, misturada confusamente com a política; as palavras proferidas não falam do direito, ao contrário, falam do politicamente correto.

 

 

Dr. Sílvio Lopes de Almeida Neto é um renomado advogado com vinte e cinco anos de atuação na área criminal. Ele adora defender seu semelhante e, além dessa bonita profissão, gosta de escrever crônicas nos momentos de lazer. Ele é casado com a rioesperense Drª Sara Miranda, reside na maravilhosa cidade de Rio Espera e é colunista em nosso portal de notícias.